4 de fevereiro de 2004

Morre Hilda Hilst, aos 73 anos, e com a escritora paulista morre muito da poesia e da prosa brasileira contempor?nea. Poucas como ela t?o incisivamente criativas e extremamente diferenciada, t?o corajosamente renovadora da fic??o.

Hilda Hilst, quando abre a boca...

Taxada desde sempre de 'maldita', 'pornogr?fica', 'escandalosa', Hilda Hilst foi, no entanto, uma das mais talentosas escritoras brasileiras. Numa avalia??o a s?rio, a cr?tica especializada j? sentenciara: "a poesia de Hilda desenha um arco de coer?ncia e inspira??o sem igual em qualquer outro autor vivo no Brasil."

Poeta e ficcionista , ela dizia-se "megaloman?aca" ao classificar sua pr?pria obra, como prova a estrofe colhida ao acaso em Da morte: "Porque conhe?o dos humanos/ Cara, Crueza/ Te batizo Ventura/ Rosto de Ningu?m/ Morte-Ventura/ Quando ' que vem'".

Hilda nunca sa?a do s?tio, pr?ximo de Campinas, onde se recolhera, h? tempos, qualquer que fosse o tipo de evento a que fosse convidada. [..]

Como toda - toda, sem exce??o - obra de Hilda, as cr?nicas de Cascos e car?cias causaram bastante esc?ndalo junto a seus primeiros leitores, e continuam a causar. Nelas, Hilda exercita mais do que nunca sua veia de provocadora profissional ,utilizando ao m?ximo o sarcasmo, o escracho, a blasf?mia, numa constru??o narrativa de elabora??o perfeita.

Megalomania: Ningu?m me leu, mas eu fui at? o fim, fiz o trabalho. A gente tem de acreditar em si mesma. Eu sei que sou o maior poeta do pa?s, n?o tem import?ncia me chamarem de megal?mana. Escrevi de um jeito que ningu?m escreveu. Foi a ?nica coisa que eu soube fazer na vida.

Honrarias: Me convidam, mas eu n?o vou a feiras de livros, nunca, nenhuma , eu n?o aguento. A gente envelhece e as coisas ficam desimportantes. Honrarias... tudo uma besteira.

?nus intelectual: 'Quelle ?poque, mon Dieu', me disse o cara da Gallimard, 'Quase ningu?m compra a Hilda Hilst, e todo mundo compra o Paulo Coelho.' Pois ?, ningu?m l? mais, nem os franceses. Disseram que "A Senhora D? ficaria dif?cil demais em franc?s. Eu respondi que em copta tamb?m ficaria, em s?nscrito... A Gallimard escreveu que eu transformava pornografia em arte. A? ningu?m leu mesmo.

Livro grosso: Precisa ter humor para escrever. Eu escrevi demais na minha vida, tentei tudo para ser lida. Diziam que Fic??es era grosso demais e Com Meus Olhos de C?o tamb?m. Parece que americano ? que gosta de livro grosso, porque n?o cai da estante.

Bordel geri?trico: Eu falei v?rias vezes para a Lygia Fagundes Telles que eu queria fazer um bordel geri?trico aqui, chamando tamb?m a Nelida Pi?on. ? uma coisa bem inventiva, porque tem tara para tudo. Eu ficaria no caixa, com as luvas longas, e a Lygia trabalharia. Mas ela ficou zangada comigo. O Caio Fernando Abreu, que morou aqui, criou um slogan: 'Venham conhecer Hilda, a fera de Buchenwald; tragam sus hijos a la sexualidad y amor de Nelida Pi?on'.

Nenhum comentário: