20 de fevereiro de 2004


ANDARILHOS NA TEMPESTADE - PARTE II

Três meses depois de sair de Lisboa, quase sem comida e água, o primeiro monte é vislumbrado pelo timoneiro. Sozinho, ele pula, grita, ri e corre içar a outra vela para pegar um vento que chegue mais rápido ao esperado destino. Ele puxa a corda, larga o mastro, amarra a corda e corre ao timão para corrigir a rota. Em pouco tempo, seus pés terão terra firme onde pisar, água doce e fresca para beber e frutas para se deliciar. Finalmente, o longo tempo de espera chega ao fim, as noites de solidão em alto mar, as águas revoltosas e a fome que ja não era mais saciada com o que ele tinha no porão, tudo agora vai chegar ao fim.
Falta pouco, o monte fica cada vez mais próximo e já se pode perceber que se for uma ilha, não é pequena, a floresta que cobre o morro é seguida de um paredão rochoso que segue a costa até se perder de vista. A água começa a tomar uma coloração mais esverdeada e o timoneiro precisa desviar de alguns recifes de corais para não ficar encalhado, ainda faltam uns dois quilômetros, talvez um pouco mais para que possa colocar os pés na areia. A espera é angustiante.
Quando o barco chega mais perto da praia, ele lança a âncora, pega a canoa e um remo e pula n'água . As remadas fortes mostram a pressa do marujo em sair do mar, antes de alcançar a areia ele pula da canoa e chega nadando até a orla.
Deitado no chão, ele gargalha o feito. Relembra de toda a viagem, os perigos que superou, a longa espera, a solidão. Ninguém creditou que ele iria conseguir, chamaram de suicida, não teve apoio de ninguém e mesmo assim pegou seu barco e aliou-se ao mar, sem saber se a água e a comida eram suficientes. E agora sua luta chegava ao fim, o objetivo foi atingido.
Levantou, olhou em volta e ficou admirando a bela paisagem onde estava. Andou alguns metros e alcançou o mato. A floresta não parecia virgem, tinha galhos verdes quebrados pelo chão e pegada de animais na terra. O interior da mata era tão escuro e amedrontador que o marujo voltou para a praia. Andou na direção do paredão e viu uma bela índia lavando algumas frutas. Para sua surpresa, ela não se assutou quando o viu. Parecia já esperar pela sua chegada.
Ele se aproximou e parou na frente dela, os dois ficaram se olhando e ela abriu um belo sorriso mostrando seus dentes alvos e bonitos. Sem dizer palavra, os dois lábios se tocaram demoradamente. Quando ela se afastou, ele ainda tinha os olhos fechados, e manteve assim na ânsia de receber outro agrado.
Mas não viu nada, quando abriu os olhos, estava em pé, dentro do porão do navio, em frente à portinhola por onde se via a imensidão do oceano e nehum sinal de terra. Era mais uma vertigem trazendo seus sonhos pra realidade.

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