15 de dezembro de 2003



"A gravidade ... não é apenas uma boa idéia. É a Lei", diz um popular adesivo de pára-choque.


A gravidade é nosso mais antigo e conhecido inimigo, a força que sentimos em nossos ossos, a força que um dia vai nos enterrar, amolecendo nossos órgãos e nos puxando para baixo, mas apesar de tanta intimidade ainda é um mistério. Qual é a lei, na verdade?

Para a maioria das pessoas é aquela que Isaac Newton proclamou em 1687 como a regra do cosmo, descrevendo como (mas não por que) dois objetos se atraem com uma força proporcional a suas massas e inversamente proporcional à distância entre eles. Mas ela já foi reescrita, e os físicos esperam que o seja novamente.

A gravidade de Newton foi substituída pela teoria geral da relatividade de Einstein no início do século 20. Einstein sugeriu que a matéria e a energia envolvem o espaço-tempo assim como uma pessoa que dorme muito cria uma depressão no colchão, fazendo os planetas, bolas de basquete e feixes de luz mover-se em trajetórias curvas, e não em linhas retas.

A relatividade geral previu a curvatura da luz, a expansão do Universo e os buracos-negros, e serviu de base para a cosmologia moderna, mas os teóricos nunca admitiram que fosse a última palavra sobre a gravidade.



"Gravidade não é apenas uma boa idéia, é a Lei"


Para começar, ela é matematicamente incompatível com as leis quânticas que governam as partículas subatômicas. Para descrever o que acontece em distâncias muito pequenas ou energias muito altas, correspondentes aos primeiros momentos depois do Big Bang, onde o espaço e o tempo se tornam descontínuos, a relatividade geral deve ser fundida com a teoria quântica, um projeto que envolveu a atual geração de físicos.

Mas recentemente alguns especialistas têm-se perguntado se está na hora de reescrever a versão de Einstein da lei, quando ela se aplica à outra extremidade da escala de comprimentos, as distâncias muito longas. A motivação vem da predominância do que às vezes é chamado de "setor escuro" do Universo.

De acordo com o que se tornou recentemente o célebre "modelo padrão", os átomos comuns formam apenas 5% do "recheio" do Cosmos. Algum tipo de matéria escura misteriosa, talvez consistindo em partículas elementares que restaram do Big Bang, formam 25%, enquanto o resto - 70% - consiste em algo ainda mais misterioso, conhecido como "energia escura".


Evidentemente, uma teoria que deixa 95% do Universo sem explicação é menos que um sucesso.

Nem a energia escura nem a matéria escura foram observadas ou detectadas diretamente. Cada uma delas foi inferida de seus efeitos gravitacionais sobre a pequena fração de "recheio" que podemos ver. Em conseqüência disso, alguns cientistas sugeriram que o que os astrônomos descobriram nos últimos 20 anos é sua própria ignorância da gravidade.

Em particular, a descoberta cinco anos atrás de que a expansão do Universo aparentemente está se acelerando, sob a influência de uma energia escura, provocou uma reavaliação das antigas certezas.

A explicação mais simples para a energia escura é algo chamado constante cosmológica, inventada primeiramente por Einstein - uma repulsa cósmica causada pela energia que reside no espaço vazio. As tentativas de se calcular essa energia resultaram em números 10 à 60ª potência maiores do que os astrônomos mediram - tão grandes que o Universo teria se desintegrado antes que os átomos ou galáxias pudessem se formar -, deixando os teóricos desanimados.

"Acho que estamos tão confusos que devemos manter a mente aberta para lidar com a gravidade", disse . Michael Turner, cosmólogo da Universidade de Chicago.

Em conseqüência disso tudo, a literatura física ficou pontilhada de sugestões de maneiras para se modificar a gravidade. Neste outono, diante de uma série de explicações para a energia escura durante oficinas de cosmologia no Instituto Kavli de Física Teórica, em Santa Barbara, Califórnia, 20 dos 44 participantes votaram em alguma variante de "Einstein estava errado".

Algumas dessas propostas se inspiram na teoria das cordas, a suposta teoria do tudo, que apresenta a possibilidade de que nosso Universo seja uma membrana (apelidada de "brane" em inglês) tridimensional em um espaço de 11 dimensões.

A maioria das cordas vibrantes que formam as partículas e forças da natureza na teoria das cordas ficariam presas à membrana, como os pêlos de um tapete. Mas as cordas responsáveis por transmitir a gravidade teriam a capacidade de se afastar, ou "vazar", no metaespaço que rodeia a membrana conforme transitam por ele, vindas de objetos distantes, segundo uma teoria apresentada em 2000 pelos doutores Gia Dvali, Gregory Gabadadze e Massimo Porrati, da Universidade de Nova York. O efeito, segundo eles, seria dar a impressão de que as galáxias distantes estariam se acelerando conforme se distanciam de nós.

Também nessa veia está a expansão cardassiana, cujo nome vem da corrida de "Perdidos no Espaço" e sonhada pelos doutores Katherine Freese e Matthew Lewis, da Universidade de Michigan. Segundo sua teoria, o Universo se acelera em conseqüência de as outras membranas tocarem a nossa. "Podemos ter um Universo em aceleração sem ter qualquer energia escura", disse Freese.

Outros teóricos estão recuando e modificando diretamente a relatividade geral, notando que quando Einstein a escreveu escolheu as equações mais simples possíveis para transmitir suas idéias. Mas talvez sejam necessárias equações mais complexas. Essa foi a abordagem adotada por Turner e seus colegas, os doutores Sean Carroll e Vikram Duvvuri, de Chicago, e Mark Trodden de Syracuse. O resultado é um Universo que se aceleraria conforme se torna maior e mais vazio.

Isso pode parecer loucura, disse Turner, mas não é mais que a idéia de 80 anos atrás, de que o Universo estaria se expandindo.

O modelo levanta tantas perguntas quantas responde, mas ele e outros semelhantes ainda valem a pena ser examinados, disse Carroll. E acrescentou: "Algo estranho está acontecendo, se o Universo chega a 10 bilhões de anos e nenhuma de nossas idéias atuais se destaca como a resposta certa, por isso precisamos ser ousados."

Nenhum comentário: